Logo antes de viajar, estava montando nosso filme na UNA e o pessoal estava em polvorosa copiando a torto e a direita o DVD do filme Tropa de Elite. Não me interessei, porque queria ver o filme no cinema, nem me toquei que sairia do país em pouco tempo e não teria uma oportunidade de assistir no cinema tão cedo.
Chegando aqui, a repercussão do filme que foi enorme no Brasil, mesmo antes da estréia, devido justamente à pirataria, nos atingiu. Com cada pessoa que falávamos no Brasil, tinhamos um comentário sobre o filme, ou simplesmente mandavam que o vissemos.
Bernardo, acho que nunca mencionei ele, é um carioca que estuda Sport Management na minha faculdade. Ele disse no dia em que o conheci que estava com um DVD do Tropa de Elite aqui em Londres. Ele ficou de me emprestar. A vontade de assistir foi crescendo junto com o número de comentários sobre o longa. Mas um dia encontrei com Bernardo por acaso, pois só temos aulas juntos na terça-feira, e ele que ainda estava morando em hotel, me falou que não conseguiu de forma alguma encontrar o DVD.
Então larguei de bobagem e recorri ao meu amigo Paul Torrent (jeito besta de disser que baixa o filme na internet). Em um dia já estava com o filme completo no Laptop. E finalmente hoje, sábado, 27 de outubro, resolvemos assistir ao filme do José Padilha. E que filme.
Técnicamente é irreprensível e casa muito bem forma e conteúdo. A fotografia não é “bonita” como em Cidade de Deus, mas confere verossimilhança ao filme. O roteiro usa um off, que embora comumente questionado, é necessário para a complexidade desta película. As atuações são magistrais.
Mas o filme vai muito além. Primeiramente, deveria ser decretado que todo mundo que assistiu a Tropa de Elite deveria ver Ônibus 174, longa anterior do Padilha. Não por acaso, os dois personagens centrais tem o mesmo sobrenome. Cap. Nascimento foi batizado em cima de Sandro do Nascimento, o sequestrador do ônibus no Jardim Botânico, segundo afirmou o próprio diretor no Programa do Jô. Os dois Nascimentos são “monstros”, contudo, à exemplo da criatura de Frankstein, estes monstros tem um criador, a Sociedade.
Embora Nascimento seja o narrador do Tropa de Elite, e a figura forte e carismática de Wagner Moura nos leve a uma próximidade com o personagem, a grande história do longa é a de André Matias. E a criação deste novo “monstro” que acompanhamos nas quase duas horas de projeção (ou no DVD ou no computador). E a cena final é fenomenal. O que esperamos do último ato de Matias? O que devemos esperar? Que ele atire e tenha o “coração”(ou a falta dele) para substituir Nascimento? Ou que ele se recusse a cometer ato de tamanha arbitrariedade e brutalidade? Aposto que pouquíssimo torcemos pela segunda hipotése. E a tela branca deixa aberto a conclusão, não do tiro, que fatalmente foi dado no rosto do traficante, mas do personagem e a nossa mesma enquanto agentes dessa trama.
Tropa de Elite é um filme díficil, pode sim gerar “efeitos colaterais”, mas como disse Pablo Villaça; “É infinitamente mais recompensador assistir a um filme que estimula a discussão e a auto-análise do que um que, por covardia ou falta de ambição, limita-se a seguir a corrente do politicamente correto.”
Leonardo OCunha